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Uma Vida de Abnegação


Era uma sexta-feira, poucos dias antes do Natal, eu tinha muita coisa para fazer. Além de ser o dia de preparação para o sábado, eu estaria coordenando um um programa de natal na igreja no dia seguinte e tinha milhões de preparativos. Mas ao começar o dia cuidando dos ferimentos da nossa cachorra que alguns dias antes havia se machucado, percebi que meu dia não aconteceria do jeito que planejara. Seus ferimentos estavam fora do meu controle e ela corria risco de vida se eu esperasse até segunda-feira. Eu teria que levá-la ao veterinário imediatamente e isso mudaria todo meu planejamento.

Muito frustrada e questionando a Deus fui para a cidade levá-la ao veterinário com a ajuda de uma de minhas filhas. Após sair de lá as horas voaram enquanto corríamos de uma loja a outra, comprando o que faltava. Voltamos para casa para ajudar meu esposo e minha outra filha que tinham ficado preparando a casa para o sábado. Duas horas depois estavávamos de volta no veterinário pegando a cachorra. Só precisava agora passar na farmácia para pegar alguns remédios e estaria em casa antes do por do sol.

Ao fazer a última curva na praça central da cidade para chegar na farmácia: “Bummm!!” ouvi um estouro enorme e fumaça começa a sair do motor do meu carro. Minha filha grita assustada pensando que o carro poderia pegar fogo. Sem saber muito bem o que fazer vi que várias pessoas começaram a se aproximar e um senhor me instruiu a controlar a direção enquanto eles empurravam o carro para o acostamento.

Ao parar o carro ele pediu para eu abrir a tampa do motor, pediu água e ficou ali analizando a situação, enquanto isso consegui tirar minha filha e a cachorra do carro e chamar meu esposo para vir em meu auxílio. Mas morando a quase trinta quilômetros de distância sabia que minha espera seria longa e que meu sábado não seria tão tranquilo assim.

O sol foi se pondo no horizonte pouco e eu ali sentada no banco da praça, com minha filha ao lado, a cachorra toda machucada e o carro quebrado. Em minha mente eu só pensava: “Porque, Senhor? De todos os dias do ano, porque essa situação tinha que acontecer hoje?”

Apesar de me sentir totalmente impotente diante da situação, estranhamente senti em meu coração uma grande paz e entreguei a situação a Deus. Foi aí que apesar de toda adversidade, Deus começou abrir meus olhos para algo que eu não estava conseguindo enxergar. Aquele senhor que estava olhando o carro, ficou ali muito tempo. Não foi embora até ter certeza que estávamos bem e que meu esposo logo chegaria para nos socorrer.

Enquanto esperávamos várias pessoas passeavam pela praça onde músicos se preparavam para um concerto de Natal que em breve começaria. Muitas pessoas passaram por nós, algumas olhavam com pena para o cachorro, outras do carro e outras de nós. Algumas até perguntavam o que havia acontecido, mas logo saiam.

Algum tempo depois, uma senhora bem vestida atravessou a rua e veio diretamente em nossa direção. Ela tinha uma garrafa de água e um copo descartável em suas mãos. Imediatamente se abaixou, chegou perto da cachorra acariciou sua cabeça e colocou água no copo para ela beber. A cachorra realmente estava com sede e em segundos bebeu toda a água. Vendo que não era suficiente, a senhora voltou à loja de onde viera e trouxe mais água. Ficou consoco por um tempo conversando e dando água à cachorra e quando teve certeza que estávamos bem, foi embora.

Depois que essas duas pessoas passaram por nós, quase não consegui mais pensar em nossa situação, mas fiquei admirada pensando no que levou aqueles dois estranhos a parar o que estavam fazendo para nos ajudar. Todos ali passavam correndo. Alguns com pressa para chegar em casa após a longa semana de trabalho, e alguns já vindo de casa arrumadinhos para passear na praça. Mas aquele senhor e a aquela senhora, que não tinham nada a ganhar, que nem tinham sido solicitados, se sentiram no dever de parar e nos socorrer de alguma forma.

Talvez você possa achar que o que eles fizeram não foi tão importante assim, qualquer um poderia ter feito. Realmente, mas o ponto não é o tamanho da ação, mas o tamanho da disposição. Porque muitas vezes deixamos de fazer coisas ainda mais insignificantes, pois achamos que não é nossa responsabilidade. E por que será que isso acontece? Por que muitas vezes, vemos pessoas em necessidade e não conseguimos ajudá-las? Por que vemos pessoas atarefadas ao nosso lado, e não temos a mínima percepção que é nosso dever ajudá-las? Por que é que de um modo geral só ajudamos quando somos solicitados?

Fico pensando se o espírito de abnegação que era a base da vida de Jesus, e deveria ser a nossa também, é algo que apenas alguns possuem. Será que é um dom apenas para uns poucos, ou será que todos nós podemos desenvolvê-lo? Será que um dia a abnegação será tão natural para nós que estaremos sempre atentos aos que estão ao nosso redor para oferecer ajuda?

Cheguei a conclusão que esta é a minha resolusão para 2019: Quero ter a sensibilidade que Jesus tinha de perceber as necessidades dos outros e estar sempre disposto a ajudá-los. Como sinto que estou longe disso! Como temos dificuldade de sair da nossa zona de conforto para ajudar aos outros!

Para nós que somos cristão esta deveria ser a norma, mas muitas vezes não é. Temos até facilidade em ajudar grandes projetos missionários e beneficientes, mas nas coisas mínimas ainda temos muita dificuldade. Mas Deus não espera que sejamos abnegado apenas nos grande projetos, para Ele aquilo que o ser humano valoriza não tem tanto valor, e aquilo que desvalorizamos é mais precioso do que tudo.

“Muitos há que se entregaram a Cristo, todavia não vêem oportunidade de realizar grande obra ou fazer grandes sacrifícios em Seu serviço. Estes podem achar conforto no pensamento de que não é necessariamente a abnegação do mártir que é mais aceitável a Deus; pode ser que o missionário que enfrente diariamente o perigo e a morte, não tome a mais elevada posição nos registros do Céu. O cristão que o é em sua vida particular, na renúncia diária do eu, na sinceridade de propósito e pureza de pensamento, em mansidão sob provocação, em fé e piedade, em fidelidade nas coisas mínimas, que na vida familiar representa o caráter de Cristo, esse pode ser mais precioso aos olhos de Deus que o missionário ou mártir de fama mundial.” (Parábolas de Jesus, 390).

Que Deus nos ajude a sermos abnegados e oferecer ajuda a quem precisar, mesmo que não seja natural fazermos isso, ou que nos custe sair da nossa zona de conforto.


Rute Bazan

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